5 de julho de 2025

Nas raízes da goiabeira eu sentei e chorei



— Já viu o que fiz lá na frente de casa?

Foi assim que meu pai abordou o assunto. A cara era de pesar, de quem logo em seguida vai contar uma má notícia. Curiosa, fui até o pátio e notei o que tinha sido feito e o que estava para acontecer: a morte do meu pé de goiaba. As folhas e galhos menores estavam em uma pilha no chão enquanto que o tronco inclinado aguardava, já desfeito de tudo, seu ultimato. 

A justificativa dada foi que a goiabeira faz sujeira demais e que é difícil deixar o pátio sempre limpo; também foi dito que faz muita sombra e isso não é bom para as florzinhas que se pensa em plantar. Dá para entender, né? Um adulto entenderia muito bem essas explicações. Mas não tem como eu ser adulta diante da árvore que passei a minha infância.

Essa goiabeira já estava aqui quando meu pai comprou a casa, antes de eu nascer. Era para ter sido cortada porque ficava próxima do muro e do portão e assim poderia atrapalhar. Por insistência da minha mãe, permaneceu.

Ali, entre o muro e os trilhos do carro, a árvore teve que se espremer e se virar na vida para sobreviver. E se virou tão literalmente que tomou a forma que precisava para continuar viva: reta até certo ponto, bem curva da metade em diante. Um L de ponta-cabeça.

Esse formato fez na árvore uma espécie de escada de galhos de tal forma que era possível subir até o topo facilmente. Para escalar criei meu próprio método e sabia exatamente onde segurar e onde ir para não cair. Levava mochila lá para cima, meus ursos de pelúcia (não gostava de bonecas), comida... e as vezes tentava até levar meus gatos. Escrevia alguma coisa num caderninho e observava quem passava na rua — ninguém podia me ver.

Além do refúgio para minha cabecinha infantil com planos mirabolantes, minha maior diversão era ficar de cabeça para baixo presa num galho, segurando todo meu corpinho pelas pernas e as mãos soltas balançando.
Publicado em 17 de junho de 2015. Deixei como estava, com repetições e falta de um melhor final. "Por insistência da minha mãe, permaneceu". Não lembrava de ter escrito isso nem dessa informação. Ontem fez quatro anos que a permanência dela nesse plano cessou.

19 de junho de 2025

Abobrinhas

Chove. Não para. Agora estou sozinha em casa, tempo propício para cometer loucuras (coloquei as roupas para lavar) (mesmo com a lava & seca nunca coloco pra secar completamente, é útil mas destrói a roupa, não tem muita escapatória, escolhas) (nessas de não querer estragar roupas, parei de usar desodorante spray — sempre odiei o geladinho do úmido encostando na axila — porque toda vez que lavava a roupa na lava & seca o resíduo do produto em vez de sumir calcificava e tornava mancha, aí mudei) (meu ódio à sensação é ligeiramente menor que meu apego às roupas).

Tá lá no fogo legumes sendo refogados e tô fazendo cebola caramelizada pela primeira vez. Gosto no meio do hamburguer, vamos ver como a de casa se comporta. Provavelmente nos estabelecimentos colocam adicionais que não tenho em casa, já eu tô fazendo exatamente o que o vídeo mais visto e mais curto (um minuto e quarenta e cinco segundos) que eu pude encontrar me mandou fazer. Eu pulei partes nesse vídeo. Sim, estou buscando ajuda.

É 21h41 e meu cérebro além de ter funcionado hoje segue funcionando até agora. Continuará amanhã? Aguarde próximos capítulos—

Série cancelada.

Acho que perdi R$ 50,00 no caminho até o mercado. Ou no mercado. Sei lá. Inferno. Falando em mercado, toda vez que vou no Maior Mercado Próximo Que Posso Ir À Pé vejo um cara que foi meu colega de escola lá pelos idos de 2004-5-6. Ele sentava na fileira ao lado da minha. Não era amigo, mas mesmo sendo da categoria jock tinha a humildade de interagir com o grupo de estranhos. Que eu fazia parte. Não vou mentir que me sinto incomodada (muito exagero) por ainda saber que o sobrenome dele vai trema e dois eles e ainda assim ele nunca ter feito um aceno de cabeça reconhecendo a minha existência. Eu sigo com a mesma cara. Pessoas vinte anos e tantos anos depois me vendo e dizendo "MARINA!! Como esquecer esse narizinho!!". Sabe.

Fiz abobrinha refogada. A cebola ficou ótima. SadSvit toca de fundo.


12 de junho de 2025

R$ 21,90

O termômetro do telefone diz que agora faz 12 graus celsius. Eu ia falar que lembro de na infância ter um desses marcadores de temperatura na casa, mas apaguei e reescrevi o que está aqui agora porque olhei para o lado e enxerguei, acho que pela primeira vez em sei lá quantos anos, justamente esse objeto — agora sem o mercúrio. A lista numerada de graus é um papel colado numa torre em vidro do lado de uma santa, sei lá que santa, que costumava brilhar no escuro. Será que ainda brilha? Eu lembro dela brilhar no escuro e me assustar com a santa. Sei lá que santa. Seria divertido se fosse de urânio, não deve ser. Volta e meia quando abro o facebook por motivo algum porque motivo não há aparece grupos sugeridos e um deles sempre é de entusiastas de objetos com urânio. Adoro como tem entusiasta de tudo.

Depois do trabalho tomei banho, me aqueci, sequei o cabelo. Dessa vez todo, não só a franja. Corri até o mercado, mesmo já tarde. Fiquei feliz por estar apenas cansada e não cansada e triste (talvez agora enquanto escrevo eu esteja, antes não). Mercado. Fui com foco, só queria um vinho, o mais barato possível, sem muitas exigências além de ser fino tinto seco. Encontrei uma etiqueta que dizia ser R$ 21,90 então só agarrei isso e mais nada, rumei ao caixa. Boa noite! Tudo ótimo. Bipe. Ué, como assim não é vinte e um e noventa, eu vi que estava lá escrito vinte e um e noventa. Outro caixa se aproxima, pergunta, respondo, digo que estou interessada no vinho de vinte e um e noventa, o mais barato. Acompanho, mostro onde estava. Imediatamente percebo que fui tapada, estou apontando uma etiqueta de outra marca, que nem tinha mais. Não sei se por cortesia ou pena ou dó, mas o outro caixa simplesmente fez o preço que eu gostaria que fosse e não quase o dobro.

Fiz risoto. Meia-noite, e agora o dia acabou.